1
Uma literatura sem nada de filosófico tende a ser demasiado rasa, tal como uma filosofia sem elementos literários costuma ser assaz tediosa.
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Os literatos parecem ter uma noção maior do que os filósofos acerca dos personagens que formam de si mesmos, porquanto criam vários outros ao longo de suas obras: a perspectiva que o literato pode colocar em apenas um personagem específico, quer o filósofo, muitas vezes, tornar absoluta: este passa a vida a aprofundar um mesmo “personagem” e chama a isso de sistema, de “rigor” – aquilo que Platão (que antes de ser filósofo foi justamente poeta) opôs dentro de diálogos, quiseram os demais transformar em um longo monólogo.
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O sentimento de inutilidade momentânea, partilhado por alguns literatos e filósofos, é aflorado na mesma medida em que cresce a certeza da utilidade futura e do reconhecimento longínquo.
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O gozo filosófico é muitas vezes um prazer na estética da linguagem, a qual, por sua vez, é trabalhada e aprofundada na literatura. Não à toa séculos de antiga poesia prepararam o nascimento da filosofia grega: como se o adensamento conceitual poético, junto do prazer na beleza da linguagem mais lírica, se tornassem, pouco a pouco, meios que favorecessem o inesperado desabrochar do filósofo.
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Há uma linha tênue, para os escritores mais profundos, entre divertir o mundo e agredi-lo.
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Será a solidão do poeta a mesma do filósofo? Por vezes não: a arma que este último aponta para sua própria época costuma ser mais explosiva e direta que a daquele e, assim, afasta logo de si a covarde multidão, que vê em sua condição de solitário o preço da sua bélica astúcia.
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O instinto artístico pode conduzir um filósofo à literatura e à poesia (como ocorreu a Nietzsche) da mesma forma que a necessidade filosófica pode levar um poeta à filosofia (tal qual Hölderlin): semelhante alternância era menos comum nos filósofos antigos (como, por exemplo, em Demócrito), os quais pareciam conter, sem uma distinção tão racionalizada, certa unidade poético-filosófica… – Dispersa pelos modernos, tal unidade tem sido, apenas aos poucos, readmitida e reestabelecida.
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De todo grande poeta e romancista é possível derivar determinadas constantes filosóficas, tal como através de toda filosofia – e sobretudo das mais simbólicas e imagéticas – conseguimos imaginar poemas e histórias.
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Segundo certa perspectiva, podemos pensar a literatura mais insigne enquanto uma alegoria de determinada filosofia, e, esta, enquanto alegoria da música mais elevada.
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O poeta almeja, por vezes, tornar quente e palatável o alimento conceitual que o filósofo se preocupa apenas em dissecar; por outro lado, este último procura clarificar, em geral, aquilo que o primeiro busca obscurecer: nessa medida, o poeta é como a densa névoa que frustra continuamente o raio de luz da lanterna empunhada pelo andarilho noturno, o qual, destemido, nem por isso interrompe seus passos rumo à floresta do conhecimento, mas, ao contrário, é ainda mais impelido pelos mistérios ocultados no horizonte enevoado.